“O dinheiro é, tipo, papel. E podem comprar-se coisas”. Ouvimos esta definição pela voz de uma criança no documentário “Banking on Bitcoin” disponível no Netflix e intuitivamente percebemos o quão simples e complicado pode ser falar do que é o dinheiro hoje, na era das criptomoedas.
De repente, estão em toda a parte. Nas notícias pela sua valorização ou desvalorização, nas conferências sobre tecnologia e inovação, e nas conversas de amigos que se interrogam sobre afinal o que é isto das criptomoedas. É uma história com menos de dez anos já que a primeira criptomoeda - e a mais emblemática até hoje - nasceu precisamente no pós-crise financeira de 2008, uma crise desencadeada a partir de setembro desse ano com a falência do Lehman Brothers e que revelou um setor construído em cima de especulação.
É nessa época que um conjunto de pessoas fora da finança, quase todos com percurso ligado à tecnologia, começa a pensar numa forma alternativa de trocar bens e serviços, sem os intermediários tradicionais que são os bancos e as empresas financeiras. Antes deste movimento, uma primeira abordagem às potencialidades da tecnologia para mudar as regras financeiras já tinha sido feita nos anos 90 por um grupo que ficou conhecido como os “cypherpunks”, rebeldes tecnológicos que viam na revolução digital dos modos de pagamento uma forma de lançar as bases de um outro tipo de sociedade.
Mas, em 2009, as condições estavam finalmente reunidas, quer do ponto de vista tecnológico - com o amadurecimento de várias ideias e projetos - quer do ponto de vista de mercado, existindo nas pessoas comuns vontade, e até necessidade, de encontrar uma alternativa ao “dinheiro” que até aí tinham usado. E é neste contexto que nasce a Bitcoin, que não é mais que um sistema de contabilidade que regista quem tem o quê. Ou, nas palavras do seu putativo criador, Satoshi Nakamoto, “um novo sistema eletrónico de dinheiro”. Ou ainda, como ouvimos também no documentário “Banking on Bitcoin”, “a moeda honesta”.
Esta revolução monetária tem como princípio a descentralização do controlo de emissão de moeda e de registo de transações. O controlo está nas mãos de todas as pessoas que participam no sistema e o que Satoshi Nakamoto – o alegado criador da Bitcoin – terá desenvolvido é um sistema de encriptação que o permite. Como? Bom, entra aqui a palavra que é a nova coqueluche da tecnologia e para alguns a grande revolução que a internet terá nos próximos anos: Blockchain, que é uma espécie de livro-mestre de registo de transações espalhado por milhares de computadores.
Já agora, Satoshi Nakamoto é um nome que um destes dias ainda dá um filme. Basicamente é a ele que se atribui a criação da Bitcoin em 2009, é o nome dele que surge em vários fóruns online de tecnólogos que participaram no processo e é também esse o nome de quem assina o artigo “Bitcoin: A Peer-to-Peer Electronic Cash System”, uma espécie de pedra filosofal de todo este novo mundo. Mas, subitamente, em 2011 desapareceu do mapa e as várias tentativas de desvendar a sua identidade não têm obtido confirmação plena.
Dito isto, as perguntas multiplicam-se sobre como funciona todo este estranho mundo novo. Em primeiro lugar: se não é um banco central a emitir moeda, quem emite a moeda sabendo que, apesar de todas as sofisticações dos mercados financeiros, esta deve refletir um determinado valor ou ser a prova de um determinado valor? Como se confia nestas moedas?
A resposta explica provavelmente porque se diz que a Bitcoin é a “moeda honesta”, já que basicamente é emitida em função do “trabalho” realizado. Qual trabalho? O trabalho de validação de uma transação ou de um conjunto de transações. E como é que é validado? Através de um computador que reúna um conjunto de características que lhe permita entrar na rede de computadores aptos a validar transações. A suportar essa rede e estes processos está, ora bem, a Blockchain.